Por Gustavo Rech.[1]
1 DA INTRODUÇÃO
Para fins de reparação do dano ambiental decorrente de atividade poluente, o pressuposto básico é a própria gravidade do acidente, ocasionando prejuízo patrimonial ou não patrimonial a outrem, a terceiros ou à coletividade, independentemente de se tratar de riso permanente ou eventual.
Nesse sentido, a responsabilidade ambiental perpassa três esferas de repressão: civil, penal e administrativa, cujos pressupostos básicos serão revelados abaixo, de forma resumida.
2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL
A Política Nacional do Meio Ambiente instituída pela Lei 6.938/1981 consagra como um de seus objetivos a imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados.
Além disso, contém dispositivos sobre a responsabilidade ambiental objetiva, ou seja, independentemente da perquirição de culpa do agente causador do dano lesivo ao meio ambiental, conforme previsto no art. 14, §1º, do referido diploma legal.
No Direito Brasileiro a responsabilidade civil por reparação de danos ao meio ambiente está baseada no risco da atividade, ou seja, para que haja obrigação de recompor o patrimônio lesado, é suficiente a ocorrência de ato ou fato que provoque dano e do nexo causal, isto é, que o dano ocorrido tenha sido proveniente da conduta de quem o causou.
O risco decorrente do exercício de determinada atividade, perigosa ou não, é o fundamento da obrigação de reparar danos, ainda que a conduta de quem o houver causado esteja isenta de culpa.
Quando se trata de responsabilidade civil decorrente de infração ambiental, sob a ótica do direito ambiental estamos verificando a consequência de uma ação ou omissão que causou dano ao meio ambiente que é um patrimônio de todos, portanto, estamos tratando de um direito que é difuso ou coletivo. Porém, poderão ocorrer danos individuais que precisam ser apurados com base nas regras da responsabilidade civil ambiental, integrando dispositivos legais tanto do direito civil como do direito ambiental.
De fato, há inúmeros casos em que o dano que afeta o meio ambiente causa danos materiais ou morais ao cidadão individualmente, casos em que cabe, também, utilizar os dispositivos ambientais específicos como o art.14, §1º, da Lei n° 6.938/81 e o art. 927, Parágrafo único, do Novo Código Civil. A doutrina denomina o dano individual ambiental como dano reflexo ou em ricochete e que atinge os interesses particulares indiretamente ao causar lesão ao meio ambiente, ou seja, afeta tanto o interesse individual como o interesse coletivo, tendo o particular direito a reparação pelo prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial que tenha sofrido, assim como há o direito da coletividade buscar a reparação pelo dano ao bem difuso.
Além da exigência do prejuízo, é necessário estabelecer-se a ligação entre a sua ocorrência e a fonte poluidora (nexo de causalidade). Quando é somente um foco emissor de poluição, sem problemas, mas quando se trata da pluralidade de poluidores, a questão esbarra no liame causal, cuja busca é difícil, mas não impossível.
As obrigações de restauração, recuperação e reparação do meio ambiente estão amparadas pela CF/88, ART. 225, § 1.º, I, cuja ideia é reencontrar a dinâmica do meio que existia antes.
No § 3.º consta a obrigação de reparar o dano causado ao meio ambiente, independente da aplicação de sanções penais e administrativas. Consagra-se, aqui, o princípio da responsabilidade objetiva em matéria ambiental.
A Lei 6.938/1981, nos objetivos da política nacional, inseriu dois comportamentos a serem procurados: preservação e restauração (art. 4.º, VI).
Não tendo sido eficaz o procedimento preventivo, constata-se a ocorrência do dano ao meio ambiente, o que leva o Direito Ambiental a apresentar um novo tipo de comportamento ao efetivar-se a responsabilização jurídica do poluidor ou do agressor dos recursos ambientais. Neste sistema conjuga-se RESPONSABILIDADE OBJETIVA com RESPARAÇÃO INTEGRAL dos danos causados ao meio ambiente.
3 DA RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL
Na esfera penal a responsabilização tem como regra geral a imprescindibilidade da conduta dolosa, salvo quando a lei disponha expressamente a penalização da conduta culposa, resultante da negligência, imprudência ou imperícia.
A Lei 9.605/1998 trata dos crimes ambientais e prevê as sanções penais impostas às condutas lesivas ao meio ambiente, inclusive à pessoas jurídicas.
Já teve oportunidade o STJ de decidir que, para o oferecimento da denúncia, exige-se apenas a descrição da conduta delitiva e a existência de elementos probatórios mínimos que corroborem a acusação. Provas conclusivas acerca da materialidade e da autoria do crime são necessárias apenas para a formação de um eventual juízo condenatório.[2]
Portanto, conclui-se que o elemento subjetivo da conduta danosa ao meio ambiente é elemento central da responsabilidade penal ambiental.
4 DA RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA AMBIENTAL
Na esfera da responsabilidade administrativa atua o Poder Executivo, através de um órgão da administração pública operando na sua atribuição de Estado de regular e disciplinar as atividades privadas, exercendo o seu poder de polícia utilizando a sanção administrativa quando houver a violação de algum interesse público legalmente tutelado como é o caso dos bens ambientais.
O Poder Executivo aplica penalidades características do direito administrativo, predominantemente as multas ou aquelas estabelecidas no regime que autorizou as atividades de determinados empreendimentos, sendo os mais comuns a interdição das atividades e suspensão.
No âmbito do Procedimento administrativo é importante observar o Princípio da Culpabilidade.
A partir da legislação vigente entende-se que o empreendimento autorizado é que é o objeto do licenciamento ambiental, e não a pessoa física ou jurídica que consta do certificado de licença. Porém, a infração administrativa é atribuída a um sujeito, pessoa física ou jurídica em face do caráter estritamente subjetivo da responsabilidade administrativa em matéria ambiental. Portanto, a imposição de penalidades na esfera administrativa não está baseada na ideia do risco da atividade, mas na conduta praticada pelo agente. Na configuração do ilícito administrativo é imprescindível o elemento subjetivo, sendo que a infração só ocorrerá se a conduta for atribuível a um sujeito que tenha agido com dolo ou culpa.
Pela análise dos dispositivos da Lei 9.605/98 que prevê as sanções penais e administrativas para as condutas lesivas ao meio ambiente faz-se necessária para que as mesmas se efetivem a ação culposa do agente causador do dano.
No caso da responsabilidade administrativa ambiental (aplicação de sanções administrativas) o caráter subjetivo está expressamente previsto na Constituição Federal e na legislação federal.
A culpabilidade é elemento da responsabilidade administrativa e no art. 225, § 3° da Constituição de 1988 está referido “[…] § 3.° As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão (…)”. Também, na Lei 9.605/98, em seu art. 3° está referido o elemento subjetivo […] As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativamente […], nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade”. Nesta mesma Lei, onde está definida a infração administrativa ambiental, novamente está prevista a conduta do agente através do disposto no art. 70 – “considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente”. Também, nesta Lei, no art. 72, “[…] § 3° A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo: […]”.
Daí que, no Decreto 99.274/90, que regulamentou a Lei 6.938/81, prevê no seu art. 37, II, ‘c’, o dolo como agravante para a gradação do valor da penalidade de multa. Portanto, se o dolo, mesmo que eventual, serve para agravar a multa, conclui-se que a culpa é indispensável para que haja a responsabilidade administrativa. Portanto, a culpabilidade é pressuposto da configuração da responsabilidade administrativa, tanto da pessoa física como da jurídica.
Para a aplicação de sanções administrativas há exigência de aferir o elemento subjetivo para assegurar a segurança jurídica uma vez que já há a garantia do ordenamento jurídico que prevê a responsabilidade objetiva para a reparação civil dos danos ambientais, como é o caso da Lei 6.938/1981.
Além disso, está em vigor, desde 2008, o Decreto 6.514/2008, que trata do procedimento administrativo ambiental, bem como regulamenta as infrações administrativas de caráter ambiental.
As infrações administrativas dividem-se em: a) infrações contra a flora; b) infrações contra a fauna; c) infrações relativas à poluição e outras infrações ambientais; d) infrações contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural; e) infrações contra a Administração Ambiental; f) infrações cometidas em Unidades de Conservação.
5 DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se, portanto, que a responsabilidade ambiental se concentrada nas esferas administrativa, penal e civil, sendo certo que nas esferas administrativa e penal deve-se apurar a conduta subjetiva do agente, dolosa ou culposa, e na esfera civil, apura-se o elemento objetivo da causa do dano, ou seja, aquela caracterizada pela ligação ou nexo causal entre a o dano ambiental em si e o seu agente causador, independentemente da existência de culpa ou dolo.
6 DA REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.
BRASIL. Decreto 65.514/2008, de 22/07/2008, dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/decreto/d6514.htm.
BRASIL. Decreto 99.274/1990, de 06/06/1990, regulamenta a Lei nº 6.902, de 27 de abril de 1981, e a Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõem, respectivamente sobre a criação de Estações Ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental e sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d99274.htm.
BRASIL. Lei 6.938/1981, de 31/08/1981, dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1980-1987/lei-6938-31-agosto-1981-366135-publicacaooriginal-1-pl.html.
BRASIL. Lei 9.605/1998, de 12/02/1998, dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9605.htm.
BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10/01/2003, que institui o Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso em Mandado de Segurança. Processo n.º 56.073/ES. Relator Ministro Ribeiro Dantas. Julgado em 25/09/2018. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=RESPONSABILIDADE+PENAL+MEIO+AMBIENTE&b=ACOR&p=false&l=10&i=15&operador=mesmo&tipo_visualizacao=RESUMO.
[1] Mestre em Direito Ambiental pela Universidade de Caxias do Sul, Especialista em Direito Civil e Processual Civil pelo Instituto Leonardo Da Vinci (Verbo Jurídico), Professor do Curso de Direito da Universidade de Caxias do Sul e Advogado Associado da área de Direito Empresarial da Balen Advocacia.
[2] Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Mandado de Segurança. Processo n.º 56.073/ES. Relator Ministro Ribeiro Dantas. Julgado em 25/09/2018. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=RESPONSABILIDADE+PENAL+MEIO+AMBIENTE&b=ACOR&p=false&l=10&i=15&operador=mesmo&tipo_visualizacao=RESUMO.